ícone face twitter instagram

#TBT101 Propostas da Sociedade Civil para a Frei Caneca FM completam uma década

19.12.24 - 13H25
Foto: Marcos Pastich

O seminário (Re)visitando o Futuro da Comunicação Pública: O case da Frei Caneca FM aconteceu presencialmente no bairro do Recife e contou com transmissão online pelo Youtube. (Foto: Marcos Pastich)


Por Mateus Paegle


Em 2014 foi criado, reunindo um conjunto de 53 propostas divididas em 3 eixos, o documento Propostas da Sociedade Civil para a Frei Caneca FM. A lista de recomendações, dividida em eixos voltados para o Financiamento, a Gestão e a Programação, teve como objetivo planejar e nortear os trabalhos da Frei Caneca FM, que iniciaria suas transmissões 2 anos depois da construção do guia.

Entre as propostas elaboradas em diálogo com a sociedade civil, a primeira foi voltada para planejar o financiamento da rádio, prevendo a criação de fundos e investimentos que garantissem a “manutenção e custeio da emissora” e o “desenvolvimento da produção radiofônica pública e comunitária”. O segundo eixo propôs, entre outros tópicos, a criação de um Conselho da rádio, com representantes da sociedade civil, da emissora e do poder público, a fim de gerir a Frei Caneca FM. O terceiro eixo foi destinado à programação da 101.5, visando garantir, entre outras coisas, “a atuação da produção independente” e o “fortalecimento da cultura popular, dos povos e comunidades tradicionais,  combatendo o racismo e a intolerância religiosa”.

Neste #TBT101, escolhemos recordar uma conversa presencial que aconteceu no dia 07 de novembro de 2024 - Dia do Radialista - em que Priscila Xavier, gerente da Frei Caneca FM no ano em questão, Patrick Torquato, ex-gerente da rádio e Gabriele Alves, apresentadora do BR-101.5, se reuniram em um seminário intitulado "(Re)visitando o Futuro da Comunicação Pública: O case da Frei Caneca FM" no evento Rec’n’Play 2024, para contar um pouco da história da emissora e sobre os desafios e avanços conquistados desde a publicação das Propostas da Sociedade Civil para a Frei Caneca FM, há 10 anos.

Confira um trecho da conversa:

Priscila: Organizei, em números, nessa primeira década da Frei Caneca FM, o que é que a gente conseguiu efetivamente tirar do papel, de propostas. Esse documento (Propostas da Sociedade Civil para a Frei Caneca FM) é norteador para nós. No eixo de “Programação” a gente se orgulha muito de ter cumprido, nesses primeiros 10 anos, 90% das propostas. “Gestão” é o que a gente menos conseguiu cumprir, porque tem muitas burocracias e processos envolvidos que não dependem só da equipe que faz, diariamente, a Frei Caneca FM. E no eixo de “Financiamento”, cumprimos 20%. Tem algumas propostas que estão lá que tinham a ver com políticas públicas da época (2014), como o Vale Cultura, então a gente sente que este é o momento de revisitar, porque tem muitas coisas novas acontecendo no nosso país. Estamos em um outro contexto.”

Participantes do (Re)visitando o Futuro da Comunicação Pública - O case da Frei Caneca FMParticipantes do Seminário (Re)visitando o Futuro da Comunicação Pública - O case da Frei Caneca FM, realizado em 2024, no Cesar School.


Priscila: Queria perguntar para você, Patrick, até para relembrar um pouco, para quem é mais jovem... Quantas reuniões foram feitas com a sociedade civil? Como é que foi esse processo de ser uma rádio que já nasceu com essa participação popular e com tantas propostas importantes?

Patrick: Quando a gente pensa em fazer comunicação pública, como diz o Detran: “Todos nós somos pedestres”. Na comunicação pública todos somos sociedade civil [...] A gente viveu em 2014 um ciclo muito particular e é bastante importante que a gente entenda que a rádio ela é fruto de uma demanda muito grande da sociedade civil, sobretudo artistas articulados, sobretudo produtores, fazedores e fazedoras de cultura que pressionavam as gestões, sobretudo a partir da gestão de João Paulo (ex-prefeito do Recife). A ideia da Frei Caneca FM é de 1960. É a primeira vez que Miguel Arraes é prefeito do Recife e é uma ideia que saiu da cabeça de um senhor chamado Paulo Freire. Ele imaginava que poderíamos, através do rádio, levar cultura e educar as pessoas. Interesses diversos, articulações diversas, bloquearam para que em 56 anos a Frei Caneca FM não saísse do papel. Ali, naquele momento, encontramos uma outra situação, uma situação positiva no que diz respeito a nossa maturidade política, que era a de a gestão entender que não fazia sentido colocar no ar simplesmente uma rádio, ela tinha que ser uma rádio pública educativa. Faz algum sentido a emissora ser pública se ela não tem diálogo com a sociedade? Nenhum. Mas por que nenhuma rádio no Brasil, entre as públicas e educativas, surgiram com o diálogo com a sociedade civil. Nunca houve, nunca houve…

A Frei Caneca FM é a primeira emissora que entra ao vivo, no ar, começa a transmitir, depois de ter passado 2 anos em diálogo com a sociedade civil, ou seja, a Frei Caneca não nasce em 2016, começa em 2014 quando a gente começa a chamar a sociedade civil para dizer: “Ei, venham falar com a gente, venham dizer o que é que vocês querem”. E aí, mais uma vez à luz de Paulo Freire, a gente pegou entidades da sociedade civil que muitas vezes nem sabiam o que era comunicação pública. A gente foi ler como era a comunicação pública em outros países, a gente usou um livro incrível do Intervozes, sobre experiências de comunicação pública em outros países. Nós líamos trechos desse livro a cada reunião e saía 1, 2 ou 3 propostas da sociedade civil. Isso é absolutamente a Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire. Tudo isso é historicamente muito significativo.

Priscila: Queria passar para Gabi agora, para ela também trazer como é que foi para ela esse percurso, tendo participado de tantos momentos e situações diferentes na Frei.

Gabriele: É uma honra muito grande para mim ocupar este espaço, todos os dias quando eu abro o microfone para entrar ao vivo no BR-101.5, penso no quanto aquele microfone ali carrega uma potência, quantas pessoas passaram por ali antes de mim, quantas pessoas passaram antes até dos microfones existirem, para que eu pudesse estar ali trabalhando hoje em dia. Ouvi Patrick contando das reuniões e… achava que tinha memória ruim, mas ele foi falando e eu fui lembrando de como era. É muito curioso me perceber na minha jornada ao lado da Frei Caneca. Em 2014 foi o ano que fiz o ENEM para entrar na universidade, por acaso entrei no curso de Rádio, TV e Internet e aí vieram me falar: “Olha, tá tendo umas reuniões aí de uma rádio que tão tentando tirar no papel…”. Colei lá e foi uma coisa que abriu a minha cabeça para sempre. O debate realmente existia e era muito bonito de acompanhar, de verdade. Era literalmente como estamos aqui agora, tinha um computador, tinha um projetor, tinha um documento aberto e Patrick dizendo: “Gente, no próximo ponto a gente vai falar sobre isso, isso e isso… o que é que vocês acham?”. Aí todo mundo abria a boca para falar, discordava e era um momento em que a gente podia discordar sem que as pessoas levassem isso para o coração e “Ah, discorda de mim então não vou dialogar com você”. A rádio estava ali, antes mesmo de está no ar, fazendo com que a gente se permitisse discordar respeitosamente e trocar ideia até a gente chegar em um ponto em comum em que todo mundo se sentisse representado. Isso é muito forte.”

****

Confira essa entrevista na íntegra através do nosso canal no YouTube. Toda quinta-feira publicamos a coluna #TBT101, onde o ouvinte relembra entrevistas importantes que a 101.5 trouxe na grade de programação.


Compartilhe