Foto: Clara Gouveia
Por Marcela Cavalcanti
Em junho de 2021, no mês de aniversário da Frei Caneca FM e ainda durante uma fase aguda da pandemia, Fábio Trummer, vocalista da Banda Eddie, conversou com Gabriele Alves sobre o lançamento do “Atiça”, o oitavo álbum de estúdio da banda. No #TBT101 de hoje, trouxemos parte da conversa onde o guitarrista compartilhou um pouco das suas referências, dos processos de produção do álbum e de como foi gravar um disco em um momento tão delicado.
Gabriele Alves: Está começando agora a nossa faixa de entrevistas! Hoje estamos recebendo a Banda Eddie pra falar do seu oitavo álbum de estúdio, o “Atiça”. A Banda Eddie, que todo mundo que ouve a Frei Caneca FM já conhece horrores, é formada por Alexandre Urêa na percussão e na voz, André Oliveira no trompete, teclados e sample, Rob Meira no baixo e Kiko Meira na bateria, mas quem fala com a gente hoje é Fábio Trummer, o responsável por voz e guitarra. Bom dia, Fábio, seja bem-vindo!
Fábio Trummer: Bom dia a todos, 101.5... Muito bacana, porque sempre que eu tô em Pernambuco eu faço muito a viagem João Pessoa/Recife pela BR-101 e vou ouvindo vocês. Ah, que legal!
Gabriele Alves: Ô, que coisa linda! A gente tava comentando aqui que Fábio é apaixonado pela Frei Caneca, né, Fábio?
Fábio Trummer: Sou porque eu me vejo nela, né? Eu me vejo nessa rádio. É um luxo a gente ter uma rádio que é a nossa voz. E quando eu falo “nossa” não sou eu só músico, é a voz de toda a comunidade, todas as comunidades e suas diferenças, e isso é muito rico. Parabéns!
Gabriele Alves: Ele tá dando parabéns pra gente no mês de aniversário da Frei Caneca, como eu tava contando pra Fábio, e é isso, a gente tem que se apropriar, e estamos falando aqui como população, viu, sociedade civil. Mas e aí, a Banda Eddie lançando esse oitavo álbum de estúdio, o “Atiça”, mais de 30 anos de estrada por essas várias rodovias, o que é que cês tão querendo atiçar, Fábio?
Fábio Trummer: A gente quer atiçar o nosso trabalho, primordialmente. Nós somos profissionais da música, é o que a gente faz da vida, a gente precisa trabalhar, por uma necessidade financeira e de realização, então pensamos que a pandemia está sendo um período muito longo e que a gente não sabe quando acaba… A gente não tá fazendo show, que é a nossa maior forma de comunicação com o público, então seria interessante lançar um álbum. A gente já tinha começado a fazer na pré-pandemia, em janeiro de 2020 lançamos o Lado A, e quando entramos em estúdio para começar o Lado B, que era para estar sendo lançado nessa época do ano passado, a pandemia chegou.
Passamos um tempo parados naquele início, mas hoje a gente sabe que foi bacana porque todo mundo ficou em casa e segurou muito a mortalidade, os leitos, a gente teve muito menos problemas do que tá tendo agora, né? É um exemplo pra gente pensar que o isolamento social funciona e que a gente precisa disso pra sair dessa bem, senão a gente vai sair já tropeçando.
Mas quando chegou em outubro, a gente já tava com uma necessidade e preocupação muito grande de se comunicar com o nosso público, e com um público novo, de preferência chegar a um público novo. Pensamos tudo isso no processo, desde a estética usada nas gravações pra se comunicar com uma galera mais nova, que já conhece essa tecnologia diferente de gravação de estúdio, de fazer música... A gente achava que tinha que ter um lançamento, primeiro porque o Lado A já tava gravado há muito tempo e a gente não queria um EP, a gente queria um LP, e depois porque estamos com essa vontade de nos comunicar, de fazer alguma coisa.
E ir pro estúdio foi massa, uma terapia massa durante a pandemia, a gente tomou todos os cuidados necessários, máscaras, abrimos o estúdio inteiro, deixamos as janelas abertas pra ventilar e só ia na gravação quem ia gravar. Tinha o dia do baixo, aí Rob chegava, passava o dia lá (...) A gente teve uma Lei Aldir Blanc aprovada e fez um ao vivo, a primeira preocupação foi “onde fazer?”. Num lugar aberto.
Na produtora da gente, em Olinda, a casa fica em uma encosta de morro, então tem um jardim grande, e como é uma encosta tem ambientes diferentes que a gente podia trabalhar nessa locação. E tudo aberto, né? Era a preocupação da gente. Com máscaras, quando não, pra cantar, a gente teve o afastamento necessário, porque a gente tá com medo mesmo. Tem gente na banda que é asmático, tem gente que já tem 50 anos, todo mundo é alvo disso, então acho que cabe o exemplo. Se a lei era pra auxílio emergencial por conta da pandemia e a gente pegou algum dinheiro dessa lei, temos que dar o maior exemplo. Foi o que escolhemos como diretriz, a partir disso fizemos outras coisas (...)
Gabriele Alves: Fábio, cê tava falando sobre esse QG que a Banda Eddie tem ali no meio de Olinda e eu lembrei que a produção do disco é assinada por você e Homero Basílio, né? Que é lá do Fruta Pão, esse estúdio que fica ali em Olinda. Me conta como foi esse processo!
Fábio Trummer: Não é o primeiro álbum que a gente faz lá. É como estar em casa, porque é do nosso produtor e amigo Zé Oliveira, então a gente tem a paz e a tranquilidade pra poder mergulhar nas ideias, sair das ideias mais fáceis e tentar achar coisas mais interessantes. A gente tem também um relacionamento com o relógio econômico que gira no estúdio que é de um jeito diferente, porque estúdio é caro, as horas de estúdio são caras, e estúdio precisa de horas porque a criação é quem determina o tempo, sabe?
Captação de som é uma coisa que também requer tempo pra achar o lugar certo do microfone, o microfone certo, enfim, é um trabalho bom de fazer, mas é um trabalho que requer tempo e isso é caro. Lá a gente tem essa facilidade, é no meio do caminho pra banda inteira também, é um lugar que é mais fácil de chegar... E foi massa, eu conversei muito com Homero, a gente produziu o Lado A e depois de um tempo o Lado B, e eu comentei com ele que a gente evoluiu muito enquanto produtores no trabalho, do Lado A pro Lado B. A gente conseguiu solucionar mais fácil os problemas que a gente teve durante a gravação do Lado A, e vimos resultados melhores em coisas que não eram problemas, mas que conseguimos aperfeiçoar.
Esse é o barato de ser músico, é você aperfeiçoar técnicas de música autoral, essa é a grande realização de ser músico, é poder fazer isso na produção musical. E o Eddie é uma banda de estúdio e de palco, são duas bandas. A gente faz uma música no palco e uma música no estúdio. Agora a gente tá ficando à vontade para perceber isso e fazer coisas no estúdio que a gente não vai fazer no palco, mas no palco a gente faz coisas que no estúdio não rola porque o clima é outro.
Gabriele Alves: E tem essa diferença mesmo até por causa do público, né? E eu gosto muito de ouvir você falar essa parte técnica, Fábio, porque às vezes o pessoal escuta o trabalho pronto e pensa que é “chegou, gravou e tá tudo certo”. Mas tem isso que cê disse, a microfonação, ver se tá tudo certo, e aí grava de novo, e aí grava de outro jeito, e testa, é um trabalho meticuloso, gente. Dá um trabalhão, né?
Fábio Trummer: Dá um trabalhão! Às vezes, pra gravar 3 minutos, eu demoro 6 horas. E 6 horas assim, de tocar, de voltar, de tirar daqui, de botar ali, e volta, e para, e respira, toma um café pra poder pensar melhor, pra achar a medida certa da música. A gente foge muito do que vem fácil, das ideias fáceis, porque o que vem fácil geralmente é uma homenagem a alguém que a gente gosta, alguém que toca e que a gente ouviu e quer repetir, ou de um gênero.
Um exemplo, a guitarrinha do reggae. Muita gente usa isso, a gente também usa essa guitarra, mas não com a marcação que o reggae faz. Eu uso pra caramba várias guitarras de reggae que são influenciadas “pro ladinho”, abafando as cordas. O reggae faz isso como uma célula rítmica, eu faço isso como uma intervenção de textura, sabe? Em momentos. Imagina que você tá vendo um filme e passa um caminhão na frente da cena com uma mensagem subliminar. Eu faço uma referência subliminar ao reggae, mas não uso a orquestração do reggae como eles usam. A ideia é essa, fugir das coisas que vêm fácil, senão eu ia tá usando essa guitarra rítmica como reggae. O baixo já é meio reggae, na bateria o cara gosta de reggae…
Gabriele Alves: Se juntar tudo vira uma banda de reggae! (risos)
Fábio Trummer: Acho que o Eddie é bem isso, a gente tá sempre buscando sair desse lugar que possa já ser de outra pessoa. É uma busca também utópica, é uma brincadeira e uma motivação que você tem pra pensar música, pra fazer música, não necessariamente é uma coisa científica que vai ter uma matemática exata. É mais uma busca pra te motivar a ir a lugares que você ainda não chegou.
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Quer continuar acompanhando esse bate-papo? Escute a entrevista completa aqui! O #TBT101 é uma coluna em que toda quinta-feira vamos relembrar entrevistas que já rolaram na rádio pública do Recife. Sintoniza com a gente nas estradas da cultura!
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