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#TBT101 - Amanda Ganimo em primeira pessoa

28.07.22 - 13H35
Amanda Ganimo

Foto: Divulgação

Por Johnny de Sousa


Há de se contar, diante de muitas lutas, a verdadeira história do povo brasileiro. E por quê não dizer que essa história tem origem nos quilombos nordestinos, onde os povos originários se refugiaram da matança e tortura dos senhores de engenho? O que ocorre mais do que deveria é a história contada a partir da oralidade do homem branco, que não tem propriedade alguma, a não ser afirmar seus olhares colonizadores.

Pois é através da mistura revolucionária de arte e ativismo que Amanda Ganimo reivindica o direito de poder contar a história do seu povo, sem ser interrompida pelas falas do colonizador. Um documentário e um EP de mesmo nome, “Nossa História Contada e Cantada Em Primeira Pessoa", é o resultado de uma extensa pesquisa das raízes africanas e indígenas da cantora, que embarcou na arte com a ajuda de amigos produtores, assim como seus e suas guias ancestrais. 

Numa conversa profunda sobre música, história e ancestralidade, a apresentadora do BR-101.5, Gabriele Alves, introduziu o projeto de Amanda ao público da Frei Caneca FM, abordando, através de uma entrevista, todo o contexto por trás das criações da cantora.

Gabriele: Quando você lançou o documentário e o EP, foi tudo dentro de um período muito curto de tempo. Ambos os documentos conversam muito, mas eu queria saber qual a ordem desse diálogo. Quem veio primeiro, o documentário ou o EP?

Amanda: Primeiro veio o documentário; o EP nasceu dele. Tanto que cada canção veio de um encontro específico que rolou dentro do filme. A gente tem essa música, chamada “Na Casa de Mãe”, o principal single do EP, que foi escrita para uma mãe de santo lá de Camaragibe, muito importante para minha formação pessoal e que é entrevistada no documentário. Outros encontros também ganharam música, como o com o Mestre Naná de Santana e o Maracatu Leão Coroado. Então o processo foi esse, a inspiração veio a partir dos encontros, colaborando para que eu pudesse eternizar essas figuras a partir de canções.

Gabriele: O poder dessas músicas conversam perfeitamente com as figuras que aparecem neste documentário, Amanda. De onde surgiu essa vontade de documentar a sua história?

Amanda: Bem, eu parto do princípio de que é necessário contar a história do povo preto a partir de nós mesmos; daí veio o título “Nossa História Contada e Cantada em Primeira Pessoa”, né. Viemos de uma grande diáspora africana, com diversos problemas desde o seu início, que foi a partir da escravidão. No entanto, sabe-se que muito da nossa cultura veio junto com a gente, resistindo bastante e somando na criação dos costumes brasileiros. É importante, no entanto, que o povo saiba que indígenas e pretos são a base desse país, e que a história do povo brasileiro foi escrita sob a perspectiva do homem branco. O meu objetivo é recriar a história do Brasil, diante da minha perspectiva, como mulher preta, e também dos meus costumes. A gente se apropriou da internet e das redes para introduzir a tecnologia do nosso povo, também, que é a oralidade. Faz parte da nossa cultura contar histórias, introduzir vida aos mais novos, aprender dos mais velhos… Acho que foi a partir daí, também, que surgiu a vontade de fazer música.

Gabriele: Acredito que as músicas também vieram como uma forma de reverenciar os seus ancestrais, não é? Os que vieram antes de vocês…

Amanda: Exatamente! Essa oralidade que eu falei se encontra na música, até porque ela conta nossa história, se conectando, logo, com os nossos ancestrais. As três canções representam figuras muito fortes na história do nosso quilombo, não sendo tão diferentes de outras canções da MPB que reverenciam a ancestralidade. Foram muitos mestres que passaram por nós, então cabe à nossa comunidade contar e cantar a história dessas pessoas. Além de que eles também são os nossos guias, influenciando, assim, nossas produções e realizações pessoais.

Além da valorização dos seus mais velhos, Amanda aproveita para reiterar a importância do poder coletivo na criação de um projeto, que mesmo diante de um enorme trabalho a ser feito, existe uma gama de pessoas que o tornam ainda mais válido. É nesta conversa que ela deixa claro o seu apoio às leis de fomento à cultura, além de revelar a necessidade do pagamento justo aos artistas, que trabalham duro para viver do que mais amam. No final das contas, Amanda se sente realizada com seu trabalho, pretendendo continuar produzindo, sempre ao lado dos seus parceiros, mestres e ancestrais.

Segue reverberando, enfim, a necessidade de cada cidadão e cidadã se comprometer com uma jornada de lutas pela libertação do povo preto. Num cenário em que atitudes e estruturas mantêm a opressão, “não ser racista” não é o bastante; é preciso ser antirracista para que cada um e cada uma de nós possa contar e cantar sua história em primeira pessoa.

Ficou a fim de escutar a entrevista na íntegra? Clica aqui pra conferir. Lembrando que o #TBT101 é uma coluna em que, toda quinta-feira, vamos relembrar entrevistas massas e importantes que já rolaram na programação da rádio pública do Recife. 

Todas as  entrevistas ficam disponíveis na sua plataforma de streaming favorita (Spotify, Deezer, Castbox, Google Podcasts, Anchor ou Mixcloud.).

Vem de carona com a gente pelas estradas da cultura!


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