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#TBT101 - O empoderamento feminino do Suraras do Tapajós através da musicalidade da floresta

10.08.23 - 11H41
O empoderamento feminino do Suraras do Tapajós através da musicalidade da floresta

(Suraras do Tapajós participou do BR-101.5 em 2021)

Quando veio ao Brasil em 2019, Angela Davis questionou: “Eu sinto que estou sendo escolhida para representar o feminismo negro. Mas por que aqui no Brasil vocês precisam buscar essa referência nos Estados Unidos? Acho que aprendi mais com Lélia Gonzalez do que vocês aprenderão comigo”.

Davis lembrou da mineira Gonzalez, referência para a luta e pensamento feminista antirracista. Mais tarde, os estudos dela seriam considerados sob a ótica da interseccionalidade, uma vez que relacionava raça, classe e gênero em suas análises.

Lembrei de Davis e Gonzalez porque, em 2021, uma entrevista muito especial aconteceu entre Gabriele Alves e Adelina Borari, instrumentista, cantora e compositora das Suraras do Tapajós. Na entrevista, que está disponível nas plataformas, Adelina ressaltou a dificuldade de ser mulher, mas principalmente, ser mulher indígena, na tentativa de alcançar outros espaços geralmente ocupados por homens. Nas entrelinhas, eu senti o discurso da grande Lélia Gonzalez, que incentivava a desestabilização das hierarquias discursivas da nossa sociedade patriarcal e racista.

Adelina Borari faz parte do primeiro grupo de Carimbó do oeste do Pará formado unicamente por mulheres, o Suraras do Tapajós, resgatando a vivência das mulheres indígenas e a musicalidade da floresta. O grupo surgiu musicalmente, em 2018, a partir da Associação de Mulheres Indígenas Suraras do Tapajós, criada em 2016, quando perceberam que a Arte era a melhor forma de fazer as mulheres indígenas chegarem a outros lugares e fazer ecoar suas vozes para além do território onde nasceram.

Gabriele Alves recebeu Adelina no BR-101.5 para falar sobre o álbum “Kirîbasáwa Yúri Yí-Itá - A Força que vem das Águas”. Na conversa, destacaram a importância de colocar a figura feminina indígena em evidência.

Gabriele Alves: O carimbó é uma forma de chegar mais longe, e a proposta do grupo é colocar a figura feminina em evidência em todos os aspectos, não é, Adelina?

Adelina Borari: Sim, como eu já falei, aqui em Alter do Chão, e em toda a região do Pará, o Carimbó só é tocado por homens, são os mestres do Carimbó. E nós resolvemos chegar nesse espaço tocando também, porque a figura feminina no ritmo ocupava somente o espaço da dança. Então decidimos ocupar o palco também, tocando os instrumentos e colocando a mulher em evidência.

Gabriele Alves: Que importante é o trabalho que vocês fazem! Nesse momento político que vivemos no Brasil (junho de 2021), porque é necessário ter essa organização e a articulação que vocês têm com As Suraras?

Adelina Borari: É importante não só por causa do empoderamento da mulher indígena, mas também para o movimento nacional indígena. Nós estamos fortalecendo a luta junto aos nossos parentes, colocando a mulher num espaço de luta. Nós já temos guerreiras que são referências: Sônia Guajajara, Joênia Wapixana, aqui na nossa região tem Alessandra Munduruku, que é uma grande liderança que está lutando contra os garimpos. E a cultura é uma forma de também alcançarmos os espaços de luta. Com a associação, fazemos o empoderamento político-econômico da mulher em defesa do seu território. A nossa missão é combater a violência contra a mulher indígena e fazer o fortalecimento e o empoderamento político-econômico dela, em defesa do seu território. Eu acho que nós conseguimos ajudar o nosso território e o nosso povo estando politizadas e independentes financeiramente.

A luta das mulheres indígenas para serem reconhecidas enquanto agentes políticos é antiga. Uma outra entrevistada que passou pela Frei Caneca FM, Cristiane Pankararu, também comentou sobre isso com Maíra Brandão e Camerino Neto, do já finalizado Conexões Telúricas. Cristiane é representante do povo Pankararu na Marcha das Mulheres Indígenas, bem como coordenadora da manifestação. 

Camerino Neto: Em 2019, aconteceu a primeira Marcha das Mulheres Indígenas e você foi uma das coordenadoras, fala um pouquinho desse processo de liderança.

Cris Pankararu: Com certeza, essa marcha foi um upgrade para todas as mulheres indígenas. Porque estamos no movimento [indígena], mas em segundo plano, exercendo o cuidado, que foi naturalizado como algo das mulheres. Quando se percebe esse lugar só do cuidado, só do papel secundário, vemos que também queremos ter fala, opinião. […] 

* * *

Ficou a fim de escutar a entrevista na íntegra? Clica aqui pra conferir. Lembrando que o #TBT101 é uma coluna em que, toda quinta-feira, vamos relembrar entrevistas e programas massas e importantes que já rolaram na programação da rádio pública do Recife.

Todas as  entrevistas ficam disponíveis na sua plataforma de streaming favorita (Spotify, Deezer, Castbox, Google Podcasts, Anchor ou Mixcloud, além do YouTube).


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