Olga Pinheiro. (Foto: Divulgação)
Por Mateus Paegle
Neste mês que marca o Dia do Orgulho Lésbico e o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica, a Frei Caneca FM dedica a coluna semanal #TBT101 a relembrar algumas de nossas entrevistas já realizadas com mulheres lésbicas. Nesta edição, traremos a entrevista feita com Olga Pinheiro no programa Relicário.
Nascida no Recife, em 1990, Olga Pinheiro é mulher lésbica, autista, artista, militante feminista, doutora em engenharia e desenvolvedora web. Cresceu entre os livros de sua mãe professora e se apaixonou muito cedo pela leitura e pela escrita, onde sempre encontrou refúgio e diversão. Fez graduação, mestrado e doutorado em engenharia na UFPE, até que decidiu mudar de área e hoje trabalha formalmente com programação. Na mesma época, conheceu o movimento de “Slam Poetry” através do Slam das Minas PE, e começou a escrever poesias e recitar em batalhas, além de se organizar em movimentos sociais.
Na conversa com Bárbara Bittencourt, no Relicário que foi ao ar no dia 2 de abril de 2024, Olga Pinheiro fala sobre o então lançamento do livro “primeira pessoa”. Um obra com caráter autobiográfico que reúne um conjunto de poesias, autorretratos e trechos de diário, onde Olga narra um processo de retomada do protagonismo de sua vida após o término de um relacionamento abusivo.
Bárbara: Eu queria que você falasse um pouco sobre o que é o “primeira pessoa” e o que ele significa pra você, Olga.
Olga: É uma pergunta um pouco ampla. Bom, o primeira pessoa é, assim, um livro que eu tô construindo desde que eu comecei a escrever poesia, porque começar a escrever poesia pra mim foi parte do meu processo de libertação, num momento que eu tava passando por várias mudanças de vida e também num momento que eu comecei a me envolver com movimentos políticos, com coletivos e tudo mais. E aí esse livro conta um pouco dessa história de transição de uma pessoa que tinha muita dificuldade de se expressar, tinha muita dificuldade de colocar limites, tinha muita dificuldade de entender o que tava sentindo, para a mesma pessoa 7 anos depois, que recita para públicos grandes, que consegue falar sobre coisas difíceis, que consegue colocar limites também muitas vezes difíceis. Porque principalmente aqueles limites que a gente coloca pra quem a gente ama não são fáceis, e a gente acaba entrando meio que num conflito de querer agradar a pessoa, mas ao mesmo as vezes aquilo não vai agradar a nós mesmos, ou não fazer bem. E aí o livro acaba tomando uma proporção ainda maior, porque esses últimos anos tiveram um contexto político muito intenso, então eu incluo, como o pessoal é indissociável do coletivo, que os muitos dos processos pelos quais eu passei tem relação com os processos políticos que estavam acontecendo, e depois com a pandemia, que não deixou de ser política, principalmente aqui no Brasil. Então eu vou entrelaçando essa história pessoal com essa história coletiva e em como isso impacta. E ao mesmo tempo também é um livro em que eu falo muito sobre temas variados, então não é um livro apenas sobre uma mulher lésbica que fala sobre amar outras mulheres, não é apenas sobre uma mulher autista que fala sobre as dificuldades do autismo, é um livro sobre uma pessoa inteira, que tem diversas áres na vida, que tem trabalho, que tem o cansaço do trabalho, que tem as amizade, que tem os momentos de contemplação, do que é que acha bonito, do que move, enfim. Esse livro tem uma importância muito grande pra mim, de conexão mesmo, principalmente com outras mulheres. Porque eu sinto que é uma vivência que, por mais que cada uma tenha suas especificidades, a gente tem muitas coisas em comum, especialmente quando se faz um recorte regional.
Bárbara: Teu livro traz muitos trechos de diário, muitos auto retratos, e aborda várias questões, como você falou, de uma pessoa que é inteira, de uma pessoa que é complexa. Eu queria saber como foi esse processo tanto de escrita, como de montar o livro, de ver o que vai entrar e em que ordem vai entrar.
Olga: Primeiro eu comecei a escrevê-lo sem muita consciência de que eu estava escrevendo. Tem uma poesia, que deu o título ao livro, que diz assim: “Demorei a entender. A primeira pessoa sou eu, não você. Sabedoria gramatical.” Então a partir dessa poesia, tinham várias outras que eu escrevia com tema parecido e eu fui meio que catalogando. Normalmente eu escrevo num aplicativo de notas, que dá para colocar as tags, então eu colocava as tags de “primeira pessoa”, só pensando como uma categoria para depois organizar. Foi aí que no fim da pandemia, num momento em que eu já estava me recuperando um pouco, porque eu passei por uma depressão bem intensa durante a pandemia, onde fiquei mais de 2 meses sem conseguir trabalhar, tive um burnout. E aí quando fui me recuperando e reencontrando períodos de lazer e de descanso, eu quis escrever um livro que tivesse essa energia mais pura. Teve um outro que eu estava escrevendo na pandemia, mais ácido, mas achei melhor não, porque achei que não era momento de lançar uma coisa assim. Então me veio a ideia de escrever, montei o livro num impulso e depois fui lapidando e criando outras coisas. Queria colocar um alinhavado, e fui buscar meus diários para inserir. Tem uma ordem mais ou menos cronológica com um pouco de licença poética, porque tiveram algumas partes que eu escrevi a poesia num determinado contexto e re-posicionei ela pra encaixar num contexto que veio num momento um pouco diferente. Então eu quis montar um livro, que é um livro de poesia, mas que tem uma narrativa, um roteiro quase linear, onde você consegue acompanhar a história de um personagem ao longo de um determinado tempo, sem esse tempo estar tão bem definido, é um tempo mais emocional do que um tempo cronológico exato.
Confira essa entrevista na íntegra através do nosso canal no YouTube. Toda quinta-feira publicamos a coluna #TBT101, onde o ouvinte relembra entrevistas importantes que a 101.5 trouxe na grade de programação.
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